quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Sorte?

Quantas horas
mortas

Quantas marcas
sem graça
sem dó
Quando os dedos
nos cabelos
me faltam
Quando os medos
de que me escondo
me acham

Quando papo
furado
faz sentido
Quando acho
num maço
20 amigos
Quantos carros
passam
e só
Quantas vidas
como a minha
viram pó

Quando desgosto
que resta
em mim
Cheiro de esgoto
de ressaca
de fim
Gosto podre
de cor ocre
de morte
Dos dias que passaram
dos dias que me restam
sorte?

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

O Cara Que Matou o Diabo

- Você sabe o que tem que fazer.
Apesar de todo suor a 9mm do meu pai não tremia em minhas mãos. Mas como eu
poderia ir adiante, afinal ele é o meu melhor amigo.
Talvez eu tenha ficado louco, essa coisa toda é uma loucura. Conheço
o cara desde criança e não é possível, quero dizer, eu vi as coisas
que ele fez mas pode ter sido, sei lá um surto psicótico.

- Anda logo, atira!
- Cala boca! Eu vou atirar porra.
- Então anda logo.

Engatilhei a arma pronto pra grudar pedaços do cérebro dele no asfalto
até ouvir sua risada. Aquilo me congelou, ele ajoelhado no chão com
uma arma apontada pra sua cabeça, ria, ria como se não fosse nada, como
se não fosse o fim.

- Você não quer fazer isso Ernesto.
- Cala boca - eu falei - Porra, por que você fez aquilo cara? Quero
dizer, que diabos você estava pensando?
- Que diabos eu estava pensando? HAhaha Cuidado com quem você chama
caro amigo, nunca se sabe quem pode vir dizer um oi. E outra,
eu só estava seguindo seu conselho, lembra?
Se eu for eu mesmo as pessoas vão gostar de mim. AHhahahaha

- Atira logo!
- Para de fica gritando na minha orelha Carlos. Eu sei o que tenho
que fazer, então para com essa merda.

Eu sabia o que tinha que fazer mas a cada minuto que passava ficava mais
difícil, e Carlos, porra ele sempre foi tão certinho, criado como Católico
daqueles que dizem que tudo é pecado. Agora ele esta aqui, decidido
a matar alguém, como se fosse fácil, os olhos dele estão cheios de ódio
nem parece o mesmo.

- Ernesto você viu o que ele fez, você sabe do que ele é capaz.
- Carlos, Carlos, CARLOS...- falou Agnaldo ainda ajoelhado e com um
sorriso no rosto - Eu realmente nunca gostei de você sabia.
Seu puritanozinho de merda. Você se acha sem pecados ahn?
- Não fale comigo.
- Será que você já se esqueceu?
- Não fale comigo.
- Se esqueceu do seu querido padre?
- Não fale comigo.
- Se esqueceu do dia em que ele tocou lá?
- CALA BOCA!
- Ah é, mas no fundo você gosto não é? Afinal você podia ter dito
não, você podia ter contado a alguém, denunciado ele. Mas não, você não
fez nada, deixou que ele continuasse apertando os pobres garotos não é?
Mas hey desde que ele não esfregue a pamonha velha em você tudo bem né não?

- CALA A PORRA DESSA BOCA!!!
- AHahahahaha.. Qualé Ernesto, você não vai atirar em mim, vamos ser
realistas. O que é que você vai dizer pros seus pais hein? Porra o que
é que você vai dizer pros meus pais?
Que a gente saiu e você resolveu meter uma bala na minha cabeça?
- Não interessa
- E você em Carlos, o que vai dizer quando for se confessar pro seu padre
pedófilo de merda?

Ele falava com Carlos mas pela primeira vez, Carlos não respondia.
Percebi que ele estava quieto fazia algum tempo já, olhei pro lado e ele estava
afastado, o ódio nos olhos dele tinham sumido, perdido lugar para
algumas lágrimas que ele tentava segurar. Seu rosto fechado numa careta
estranha, uma mistura de pavor e surpresa.

- hahahaha HEIN CARLOS O QUE VOCÊ VAI DIZER PRA PORRA DO PADRE?
- Ele vai dizer que matamos o demônio - sem pensar puxei o gatilho
três vezes, o barulho foi ensurdecedor. Carlos deu um pulo, pareceu sair
de um transe, me olhava agora admirado, quase com orgulho.
Além do eco e do zumbido em meus ouvidos, não ouvia mais nada. A poça
de sangue se formava, ele agora caído com os olhos arregalados. Quase não percebi
que Carlos falava comigo.

- Ele morreu?
- oi?
- Ele Morreu?
- É, eu acho. Eu  acho que sim.
- E agora? O que a gente faz, você se sujou.

Olhei e vi que o sangue dele tinha respingado em mim. Mas eu não me importava
algo tinha mudado, algo estava diferente em mim. E eu não consigo para de pensar
no que ele disse quando chegamos aqui.

"Eu não me importo em morrer Ernesto, hahahah desde que seja você que me mate.
Vai se abrir um novo mundo diante dos seus olhos. hahahahaha
Quero dizer, você acha mesmo que pode me matar? uhm? Será que é hoje
que lhe cresce um par de bolas?"

Carlos e Eu não trocamos uma palavra no caminho de volta pra casa, ele apenas disse:
- Te vejo amanhã.
E foi isso.
Assim que ele entrou, comecei a descer a rua e decidi que os pais do Agnaldo mereciam
enterra-lo, afinal eu não acho que eles saibam quem ele realmente era.
Passei por um orelhão antes de ir pra casa.


"- 911, qual sua emergência?
- ah, eu ouvi tiros eu  acho que alguém morreu, eu ouvi eles discutindo.
- Senhor qual o seu nome senhor?
- Foi na rua João Lopez, no parque industrial.
- Senhor..."



Mais tarde na rua João Lopez.

- Malditos moleques, acham engraçado ficar passando trote pra policia.
- Tem uma poça de sangue ali Senhor.
- Ah esquece isso, provavelmente um bicho que morreu ai.
- Mas senhor, tem bastante sangue..
- Hey! Novato! É o seguinte, sem corpo sem assassinato, aprende isso. Agora vamos, to afim de um café.




sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

Teto de Vidro

O barulho das sirenes era ensurdecedor, parecia que eu
tinha um enxame na cabeça. E esse hipócrita que diz que é meu pai
me arrastando por ai. Idiota. Eu poderia estar dando um trago ou
chupando a língua de uma garota uma hora dessas. HAHAHA, pelo menos
eu poderia estar tentando chupar a língua de uma garota.
Uma porra de incêndio, ele me trouxe pra porra de um incêndio.
O que diabos ele ta fazendo aqui, ele é policial.

O pouco que restava do fogo estava agora sobre controle e sendo
dissipado, havia apenas fumaça e fuligem. Ele era delegado não bombeiro,
não entendia o motivo de ter sido chamado. Tanta coisa acontecendo em
casa e agora essa perda de tempo. Não podia perder tempo, não quando
seu filho era o que mais parecia causar problemas na cidade.
Bom talvez tenha sido chamado aqui porque essa peste de moleque
foi quem começou o incêndio. Era só o que faltava, mas se fosse
isso não o surpreenderia. Acabara de pegar ele em um fundo de vale
fumando maconha com um bando de vagabundo que roda pela cidade.
O moleque parecia fazer de propósito, estava deixando a mãe dele
louca e doente, porra, até ele já estava ficando louco.

Se aproximou do tenente do corpo de bombeiros e procurou se informar
da situação e porque diabos havia sido chamado. A fumaça castigava
os olhos e os pulmões então tratou de ser direto.

- O que aconteceu aqui tenente? Por que diabos fui chamado?
Incêndio é com seus rapazes, não?
- Boa noite delegado, eu não te chamei aqui por causa do incêndio.
- Então?
- Infelizmente foi o que achamos aqui depois que controlamos as chamas
que me tirou o sono. Um corpo carbonizado, pequeno, provavelmente
uma criança. 12 ou 13 anos.
- O Que? Como assim?
- Por aqui...

Tenente Pedro Alberto, 13 anos no corpo de bombeiros. Conhecido por sempre
manter a calma, fama que lhe rendeu a confiança das pessoas certas
e o atual cargo na corporação.
Mostrou o caminho entre todo alvoroço até o corpo e a imagem foi
chocante. Restos de uma pessoa encolhida, já nenhum sinal de pele ou
qualquer outra coisa além dos ossos que pareciam se esfarelar ao
toque. Visão que tirou as palavras de mais um veterano no serviço.
Delegado Renato Abraão lima, 17 anos na policia. Sem palavras.
Ainda em uma espécie de transe olhou para o tenente.
Olhou ao redor.

- Droga - começou - droga, vocês apuraram o que aconteceu aqui?
Alguma informação?
- Não, nós apagamos o fogo. O trabalho de detetive é com seus
rapazes Delegado.
- Droga, chame a peri...

Um ruído alto pegou todos desprevenidos, entre chiados e resmungos
dos que ali se encontravam, a voz de G.G Alin parecia estar sendo
vomitada do inferno.
Olhou em volta e quase não acreditou, aquele peste que saiu do ventre
de sua esposa. Ele realmente não queria acreditar naquela cena.
O desgraçado pegou o megafone e posicionou na saída de som do celular
exibindo a merda toda pela janela do carro.
Ele sorria feito um louco, inacreditável.
Os primeiros passos do Delegado Abraão foram quase em câmera lenta,
mas quando sua atenção foi ganha, começou a correr e aqueles olhos
penetravam nos seus.
Olhos loucos.
Agora corria fora de controle.
Chegou ao carro, o moleque simplesmente sorria e continuava segurando
o maldito megafone. Aqueles olhos.
Abriu a porta do carro com uma mão, com a outra o jogou pra fora de lá.
Começou a arrasta-lo num ritmo frenético, o garoto apenas sorria.
Gargalhava.
A cena era bizarra e surreal demais pra que qualquer pessoa ali
dissesse algo ou se quer permitisse que o ar saísse dos próprios pulmões.
Chegaram ao corpo e o semblante do moleque se transformou em fração
de segundos, uma careta de nojo e espanto agora estampavam seu rosto.
Renato totalmente perdido em raiva, forçava a cabeça do próprio filho
contra um cadáver, preto e molhado. Num impulso Tenente Alberto chegou
aos dois e puxou com toda força que tinha o delegado pra longe.
Estava possesso, mas aquilo não podia continuar. Começavam a chegar
repórteres e toda imprensa da cidade e região. E com essa maldita
mania de má utilização dos avanços tecnológicos, logo todo esse circo
estaria na internet. Isso era inadmissível a sua reputação.
Conhecia o menino, sabia que era problema. Mas basta.
Caíram os dois, o menino livre engatinhou pra longe do corpo.
Suor e lágrimas escorriam do seu rosto. Estava aterrorizado.

- Porra Renato, que porra você ta fazendo?
Nenhuma palavra em resposta, o delegado parecia de volta ao transe.
Se levantou, puxou o moleque pelo gorro da blusa e foram para o carro.
Os pneus levantaram pó enquanto saia em disparada dali.
O celular ainda tocava G.G Alin.
    "Inútil porco-homem em seu uniforme azul falso
    Você tenta me dizer o que fazer, mas eu nunca vou conformar"
Se limitou a arremessar pela janela o celular, acelerou
no caminho de volta pra casa.
E simplesmente acelerava.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Bola Fora

Encontrou em meio a bagunça que tirava da garagem uma caixa velha
e empoeirada. Coisas de 30, 40 anos atrás, da sua adolescência,
do colégio. Fotos antigas do casamento, ele ainda tinha todos
os fios de cabelo na cabeça, ainda podia sorrir.
Achou seus antigos cadernos do colegial, rabiscos ingênuos de alguém
que ainda não fazia ideia do que era viver.
Foi até a cozinha escura, abriu a geladeira e se serviu de um copo
de leite. Sentiu-se um estranho na casa que lhe custou 30 anos de
trabalho.
Se sentou a mesa e começou a folhear ao acaso, relembrando os planos,
achava que a essa altura da vida seria um velho feliz, prestes a
se aposentar.
Filhos, netos.
Errou, apostou suas fichas em uma mão ruim. E o pior, ele viu as
cartas, ele tinha a vantagem sobre tudo. E fodeu com tudo.
Hoje era tudo cinza e infelizmente teve que chegar até o fundo
pra ver que tinha caído no poço.
As suas coisas encaixotadas num canto, as fotos em que aparece
foram retiradas da parede, porta-retratos tombados pelas estantes.
Engoliu o leite, o choro e o orgulho.
Começou a levar as caixas para o carro.
A cada caixa morria um pouco, mas era irremediável o fim. Era
hora de pagar pela péssima pessoa que se tornou.
Olhou o carro estacionando, era ela.
Tinham combinado que ele pegasse todas as coisas e deixasse a chave
na caixa do correio. Ela não queria vê-lo. Tarde demais, ele perdeu
um tempo sentindo pena de si mesmo na cozinha. Ela olhou pra ele
e bufou.

- Achei que tínhamos combinado que você não estaria aqui quando
eu chegasse - disse ela em tom de briga.
- Olha - começou - eu achei que daria tempo, sinto muito.
- Ah claro que sente.
- Putz, eu não quero brigar. Não faz sentido brigar agora.
Eu sinto muito mesmo, pelas coisas que disse e que você sabe
que não são verdade, que eu não acho tudo aquilo de você.
- Agora é fácil você dizer isso não é? Você parecia estar muito
seguro da sua opinião quando me chamou de "vadia dadeira filha da puta".
- Eu... eu realmente sinto muito. Por tudo. E você não vai mais
ter problemas comigo.
- É? Por que? Tá pensando em morrer é?
- Eu só quero dizer que eu finalmente entendo, não vou atrapalhar
ou atrasar você de alguma forma. Nunca mais, é hora de eu começar
a pagar pelas minhas escolhas.
- Como assim? O que você quer dizer? Olha aqui seu velho besta
se você tiver pensando em fazer alguma besteira e me deixar na mão
você pode para com isso.
- Eu já disse, não vou te atrapalhar. Não se preocupe.

Colocou a ultima caixa no banco de trás. Entrou no carro.
Ela ainda estava ali parada com ar de tristeza.
- Eu sinto muito - disse, ligou o carro e saiu.
Olhou pelo retrovisor e viu sua vida ficando lá trás.
Sozinho no carro, dirigiu até um hotel qualquer.
Pegou um quarto qualquer.
Era assim que seriam as coisas agora, um punhado de "qualquer" e "tanto faz".

terça-feira, 19 de novembro de 2013

O Farol

O seu riso seco, falso
Atingiu  meu peito rápido
Apodrecendo meus pulmões
Riso infeccioso, me tirando o ar

Doeu mais foi ver seu corpo
Preenchendo outros braços
Seu batom manchando outros lábios
Eu barco perdido, nenhum farol

De longe eu vi, fingi enxergar
Luz salvadora, santa a olhos desesperados
Restos de um amor que não vingou
Aguado por lágrimas que caíram orgulhosamente em segredo

Caí do céu e fui ao inferno frio
No piso gelado, eu descalço e um violão
Amaldiçoei lembranças que me salvaram um dia
De cara no chão, implorando que fosse o último porre

Nas olheiras fundas, hoje velho renovado
Ainda ando descalço, ainda ando só
Mas quase nada me tira mais o sono
Na noite arrasto o pé, grito voz de cantador, levanto pó

Segui sozinho a beira-mar, a pé de serra
Aprendi nos meu erros que todo mundo erra
As vezes vejo seu sorriso, e rio feliz ao ver o sol
As rugas tristes do meu rosto abraçaram a solidão do mar, esqueceram o farol

Quantas vezes me perguntei
Amo eu um amor de louco
Ou eu são louco de amor?

Eu

Que cor eu sou?
Eu sou cinza nostalgia
Cor que ao sol do meio dia
Parece tão feliz.
Que som ecôo?
Ecôo som de solidão
Cantado aos berros
Pra provar que estou melhor assim.
Que gosto tenho eu?
Gosto azedo de pecado
De um mau premeditado
Que à mim se acometeu.
Te entrego as rédeas
Endireite por favor minha vida
Mas pare naquela esquina
Pr'eu saber quem sou.

Iraci

Olho pra trás e vejo o quanto tudo mudou
hoje escasso em paciência e abundante em rugas
revelo na rispidez das respostas meus desamores
com um olhar cansado, com mãos sofridas
deixo todos saberem que vivi demais.

Há 30 anos a água ferve no mesmo bule
não sou de me desapegar
ainda me lembro do outono de 83
da novidade de meus cabelos brancos
quando ainda não me diziam que vivi demais.

Ah Iraci, é amargo admitir
que se cheguei até aqui
foi porque você fugiu de mim

Meu sorriso amarelo imita o retrato na parede
tirado nos dias em que ainda éramos um
você ao pé do ouvido dizendo os males que o álcool traz
eu te calando aos beijos
sem saber que viveria demais.

Me irrito ao lembrar de seu atrevimento
ir embora daquele jeito me fez muito mal
sei bem que a vida é dura e que as vezes parece que não dá mais
você escolheu o fim
e me deixou viver demais.

Ah Iraci, é amargo admitir
que se cheguei até aqui
foi porque você fugiu de mim

Lembranças

- Nem te vejo mais
- Porque some assim?
- Aonde foi?
- Foi feliz?
- Ah nem me diz
- A vida é assim
- Fica ruim
- Quando não pode piorar.
- Me conta mais
- Como é que vai
- Aquele rapaz
- que escolheu pra te amar
- Senta aqui
- Toma um café
- Espera um pouco
- Tenho tanto a te falar

- Olha pra mim
- O tempo passou
- Se eu guardei rancor?
- Não não sou assim
- Lembro feliz
- Pelo que passei
- Mas outro amor
- Nunca encontrei
- Sei tão bem que errei
- Mas não cabe a mim julgar
- Hoje levo comigo
- Só que for durar
- Não me olha assim
- Não foi erro teu
- Você só não conseguiu,
Me amar

Me espanta
O desencontro
Por tantos anos não pude achar

E agora
Assim as tantas
Num bar qualquer fui te encontra

Sobrevivi sem você
Envelheci sem você
Só levo aqui

Lembranças...

O Pouco Que Restou

Com um cigarro na mão pra preencher o vazio que você deixou
O céu ta cinza e alguém no rádio acha que entendeu o amor
Ah cala essa boca, o amor é coisa boba você nem pensa pra falar
Acendo outro cigarro mas eu nem fumo, é só pra compensar:

O frio que faz
O pouco que restou
O que não vai mais voltar
E o que voltou

Com uma arma na mão e a loucura que me faz tão bem
Eu faço um café, e se eu morrer o que é que tem?
Ah eles vão chorar, dizem que é bom de vez em quando
Ah eles vão sofrer, é muita farsa pra pouco pano:

Que sobrou do que você levou
Que sobrou do que eu queimei
Do que não faz sentido
Bem o café, bom, eu derramei

Todo mundo diz que eu to legal, que vai ficar tudo bem
Eu digo pra todo mundo que eu to legal, que vai ficar tudo bem
Me diz quem é que não mente, quem é que gosta de dar satisfação?
Me diz quem é que não se sente mal, opa, espera aí, tem gente no portão

[pausa]

Do que eu estava falando? Ah nem importa mais
As horas se arrastam os dias passam apertados eu continuo vendo TV
Lembra quando você reclamava, dizia que eu ia ficar cego
A boca maldita, você nem sabe que acertou:

Eu não vejo mais meus amigos
Não vejo nada de bom na TV
Eu não vejo mais minha família
Droga, nem vejo mais você

Esses dias resolvi sair depois de sei lá quanto tempo
Sozinho mesmo, como eu acho que sempre foi
Fui só até o bar, bebi um tanto, comprei um tanto, voltei pra cá
Xinguei você, xinguei meio mundo, bebi até apagar:

De manhã - A cabeça doendo
De uma manhã tão cinza
De manhã - acordei bebendo
De manhã acordei ranzinza sem ninguém pra reclamar

Com um cigarro em uma mão e um copo na outra, não consigo mais dormir
Fico fantasiando como, quando e onde vou te encontrar
Ah alguém me cale a boca, que o amor é coisa pouca, mas ninguém vem me acudir
Fico fantasiando como, onde e quando a morte vem me buscar.

Sorriso Seco

Eu nasci do medo
medo da solidão
Eu cresci sozinho
meio a uma multidão
Eu falo sozinho
Porque ninguém mais vai entender
Eu me perco te procurando
E se eu te encontrar, o que fazer?

Levo um sorriso seco no rosto
pra você achar que ta tudo bem
não quero te preocupar meu amor

Caminho solitário e vou longe
Te faço Acreditar que ta tudo bem
Pra não te aborrecer com minha dor

Me embriago sozinho
Pra não me envergonhar amanhã
Vou enlouquecer com o vazio
De que me serve uma mente sã
Eu vou assistir TV
pr'eu ter com o que sonhar
Perguntei por você
Mas pedi pra ninguém te conta

Levo um sorriso seco no rosto
pra você achar que ta tudo bem
não quero te preocupar meu amor

Caminho solitário e vou longe
Te faço acreditar que ta tudo bem
Pra não te aborrecer com minha dor

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Sobre estar vivo...

As vezes o simples fato de estar vivo
Dói tanto, que a gente finge que é solidão
Então coloca um sorriso no rosto
e sai, se farta das pessoas como se fosse a ultima vez que as vê

Mas depois é tudo o mesmo
Na volta a casa ainda esta vazia
A torneira ainda pinga
E aquela dor agora escorre aos litros
E você arruma motivos pra justificar
o que parece sem sentido

Ninguém te fez mal
você não tem tudo mas tem o suficiente
Amores? Esses vem e vão
E essa dor besta e injustificável
cresce, ganha força
e só dói porque você esta vivo

As vezes o simples fato de estar vivo
é desesperador, mas você acorda e vai trabalhar mesmo assim
você preenche os seus dias com conflitos
apenas pra ter algo além da dor com o que pensar

Mas os dias continuam os mesmo
A cidade está mais fria
mas só você vê
E aquela dor parece te vigiar aos risos
Você se amedronta na frente da vida,
que parece um perigo constante

As vezes o simples fato de estar frio
é animador, porque você sabe que nesses dias
todos sentem o gostinho amargo do que é ser você
e se delicia com os protestos alheios

E no fim quem é normal?
A casa ainda está vazia
a torneira ainda pinga
e a dor dói tanto
que você pensa que o simples fato de estar vivo
é razão pra sofrer

Chuva, Frio, Whisky e Rock n' Roll

Dançava sozinha com os pés descalços no piso frio.
Era dia mas estava escuro devido a forte chuva que se aproximava.
Embalada por uma balada rock n' roll, girava lentamente com os braços no ar
como se estivesse dançando com alguém. Segurava o copo de whisky delicadamente
e imaginava viver a 40, 50 anos atrás. Se imaginava dançando em um bar
mal iluminado, nos braços de um rapaz encorpado, alto, com uma jaqueta
de couro preta meio gasta e empoeirada.
Dava um gole no whisky, ria sozinha por ter um sonho tão clichê.
Ela jurava ter nascido na época errada, apaixonada por carros antigos, filmes
em preto e branco, os Beatles, o Elvis... ai o Elvis, love me tender tocava agora
e arrancava-lhe arrepios em lugares que nunca julgara possível.
O que aconteceu com os homens? Será que eles realmente acham que
ter um carro já é o suficiente? E essas garotas de hoje em dia? Não se dão ao respeito
e ainda a chamam de esquisita por gostar de coisas de 4 décadas atrás? A voz macia passava pelos seus ouvidos, a boca sorria escondida atrás dos longos cabelos
escuros. Conseguia se ver lá, com o rei do rock dançando e olhando pra ela na primeira fila,
sendo invejada por todas as garotas de uma década inteira.

Trocou o disco
Completou o copo

O vento começa a soprar forte lá fora. Ela voltava a dançar como se
estivesse hipnotizada. Como gostava de ficar sozinha.
O silêncio a completava de uma forma mágica, mas ela se preocupava as vezes.
Ultimamente com mais frequência, tinha medo de que a solidão a transformasse em
uma pessoa amarga feito personagem de desenho, uma velha chata com cara de bruxa
que tem a casa apedrejada pelas crianças do bairro.
Sabia que a solidão não a fazia feliz mas a completava, vivera tanto tempo
assim que tinha medo de não saber o que fazer se deixasse alguém se aproximar.

Lembrava dos amigos, há quanto tempo não os via. Sim fazia tempo,
a última vez que os encontrou foi em uma festa furada regada a pop rock
e maconha, e deus abençoe pela maconha senão teria sido insuportável.
Não era chegada em drogas, mas fazia o que fosse pra dar um riso sincero
ao menos uma vez na semana, sabe, aqueles sorrisos bobos mesmo, de boca bem
aberta e sem vergonha que a vejam fingir ser feliz.
Odiava bancar a filosofa mas sempre que bebia era assim,  o cérebro
trabalhava numa velocidade surreal e tão racional. Bom, pelo menos no começo
porque no fim era só merda ...

Bailava sozinha, melancólica, ria feliz de sua tristeza.
Como sou bonita - pensava ela - como tudo consegue ser tão mais lindo
assim distante.

Voltou a musica
Completou o copo

As vezes ela tinha vontade de chorar, por nada, só chorar por chorar.
Mas não permitia a si mesma chorar, nem escondida, nem disfarçada na chuva.
Que a dor doesse dentro dela em silencio, ninguém precisava a ver assim, criando caso
a toa. Ela jamais perdoaria a si  mesma se a vissem vulnerável. Era tão mais gostoso
rir da própria desgraça.

Mas ela não queria mudar, por deus, mesmo que quisesse não saberia por onde
começar, então ela completava o copo de whisky, voltava a musica
e dançava embriagada sozinha com os pés descalços no chão frio num dia de chuva.

"E ela dança, dança, dança até cansar
embriagada sozinha dormia com frio no sofá
E ela dança, dança, dança sem parar
ria triste e deixava a solidão guiar..."

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

O Corpo Podre da Estrada

Tinha um corpo podre na estrada
E eu parei pra ver
Tinha um corpo podre na estrada
E eu jurava que era você

Com um galho eu cutuquei as entranhas
E olhei pro lado pra ver se vinha alguém
Ventava frio na rua deserta
Nenhum cachorro, nenhum pássaro, não, ninguém

Aviões passavam lá no céu
Quem sabe ele tenha caído
Quem sabe alguém o procurava
Quem sabe ninguém tinha percebido

Tinha um corpo podre na estrada
E ninguém sabe o que aconteceu
Olhando para o corpo podre da estrada
Eu percebi que o corpo era meu.

Indecentes & Estimulantes - Sem Razão Social

Tudo não passou de um erro
a voz doce e suave que fazia flutuar
são gritos que não suporto mais
me deixa à boca um gosto amargo
que nem mais uma dose
de mentiras pode tirar

e esse desejo de ficar que me consome
que me embriaga
me ganha as pressas
e de um apagão de bêbado treinado
acordo atordoado
com suas pernas em meu quadril

ressaca moral
que só cura com outra dose
imploro por ar
mas você diz: não pode
e me abandona a sarjeta do desamor
feito bebida forte
que desce quente
a cada porre
fica mais atraente
amanheço num sofá juntando o pouco que me restou

preciso do que sou
nas manhãs de chuva quente e vento frio,
mas até isso você me roubou
me pego aos socos com o espelho
que por misericórdia ou desespero
me mostra a face de quem mais me envergonhou

onde foi que tudo mudou?
em que esquina você deixou de me querer e começou a me usar
fui motivo de chacota, razão de riso frouxo em mesa de bar
preciso acordar e não te ver
deixar de enlouquecer com teu cheiro traiçoeiro
não me enganar com esse sorriso
lábios que não são mais meus

ressaca moral
que só cura com outra dose
imploro por ar
mas você diz: não pode
e me abandona a sarjeta do desamor
feito bebida forte
que desce quente
a cada porre
fica mais atraente
amanheço num sofá juntando o pouco que me restou

Chão de giz

Tossiu quando a fumaça desceu a garganta.
Primeiro cigarro e mais uma vez a vida se mostrou nada especial, nem sinos
ou trilha sonora de fundo, apenas o vento assobiando uma canção antiga.
Os carros passavam perto, não há calçadas em autoestradas. Justamente porque quem
andaria por elas não deveria estar lá. Fugindo, deixando tudo pra trás.
A sociedade não suporta pessoas assim, não pode simplesmente sair por ai.

 - Quem foi que disse que não? - disse a si mesmo com o dedão no ar esperando
que alguém, qualquer um, parasse e lhe desse uma carona.
 - Pra qualquer lugar - diria, estava ensaiado. Ensaiado todas as incertezas
do futuro próximo e tudo que sabia é que não voltaria. Não era uma opção.

Carregava na mochila ainda com cheiro de nova, camisetas, cuecas, uma calça e
um par de meia. Um cantil velho cheio d'Água, um canivete e 30 reais roubados da
carteira do "velho miserável". Assim que,  na maioria das vezes, chamava aquele que era seu pai,
mas muito recentemente deixou escapar, meio sem querer e foi o inicio de tudo ou quem sabe o fim.

Passou por um posto de gasolina e viu seu reflexo no vidro de um carro que saía, com cigarro no canto da boca
e o cabelo bagunçado, pela primeira vez na vida gostou de ser assim, de ser ele.
Sim ainda havia marcas dos tapas e arranhões, o olho não estava inchado mas aquela cor tipo um marrom claro ainda
o lembrava das surras. 14 anos de surras que moldaram o homem que era hoje.
 - homem sim. - argumentava consigo mesmo. Apesar da pouca idade já havia amadurecido e também não era como se lhe
foi dada escolha. Sabia como funcionavam as coisas, o mundo. Exatamente por isso sabia que não sentiria falta de nada,
da escola, dos supostos amigos. Não podia andar com eles, não era um deles. Ele sabia, eles sabiam, porra, até a droga
dos gatos das tias gordas e sebentas deles sabiam. Ele era de outro lugar, forasteiro, intruso. Por isso o tratavam
como o tratavam, como se ele fosse doente e que ao simples toque mataria qualquer um.

A cada passo o pó grudava no tênis, e a cada suspiro de cansaço lhe dava um caldo de força, vinda de sabe lá onde. Tudo que
importava era continuar andando, aquela ânsia de que ainda não era longe o suficiente, que dali ainda sentiria a dor dos socos
o mantinha focado, enérgico. Cuspiu a bituca longe, de um cigarro que queimou ao acaso e tratou logo de acender outro com a promessa
de fuma-lo por inteiro. Tomou um gole de água e viu o sol covarde se escondendo, se encostou em uma árvore imaginando onde passaria a noite.
Olhou pra trás e viu o campo fechado por árvores, pulou  a cerca de arame e havia achado o quarto da noite, e o melhor, era de graça.
Subiu em uma arvore lá ao meio mas não tão longe da estrada, uma que tinha dois troncos fortes que cresceram juntos. Perfeito.

Escureceu de vez e os carros que passavam podiam ver ao longe o ponto vermelho do seu cigarro, adormeceu em cima da árvore sentindo o vento trazendo
uma onda de calor.


Os bombeiros tiveram trabalho a conter o incêndio, dois hectares em chamas. Acharam o corpo, ou o que restou dele, carbonizado no chão.
Tentavam determinar se o incêndio era de causa criminosa ou acidental e as coisas se complicavam pois havia um corpo. Perguntas surgiam toda hora, tipo:
 Será que ele morreu tentando apagar o incêndio? Será que ele o causou? Por que aqui? Alguma rixa com o dono do lugar?


...adormeceu em cima da árvore sentindo o vento trazendo
uma onda de calor. Não dormiu muito tempo e logo começaram os pesadelos, as velhas surras, a voz do "velho miserável". Se contorcia em cima da arvore e nisso
o cigarro caiu de sua boca, encontrou lá embaixo o mato seco.

O pesadelo era muito intenso, acordou de súbito e viu o inferno embaixo de si.
Com o susto escorregou e despencou da arvore, os carros que passavam, agora em menor quantidade, viam chamas gigantescas.
Mas o que assustava eram os gritos, gritos fortes que logo se transformaram num urro rouco e se calaram.





quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O Homem Das Estrelas

Ainda tentava entender o que se passava, como uma falha assim não foi vista?
será que alguém viria? Viria pra onde?
No escuro mudo do espaço em que se perdeu não há placa e sinalização via satélite,
apenas o breu e a solidão.
Uma missão de porte simples, rotineira; se transformou em seu inferno pessoal.
Rum... quem dera que houvesse Deus ou demônio ali, outros pecadores.
Seria um alívio, água no deserto.
O sol era agora uma luz distante, esperançosa. mas já tinha tomado conta
de qual era sua situação.
Suprimentos para uma estadia de 3 dias no espaço. Combustível suficiente para uma aterrissagem.
Vagava ermo no universo pensando desesperadamente em uma solução.
Apertava os olhos buscando enxergar no abismo infinito uma luz de esperança,
via apenas restos dela, pedaços de estrelas mortas há anos.
O escuro traiçoeiro enganava a mente, revia amigos e familiares
flutuando ao lado de sua nave.
A saudade doía no peito, mas não só a saudade como a dúvida.
Será que sentiriam sua falta?
Será que alguém iria chorar?
Não restava mais nada da terra a lhe fazer companhia, nada além
de lembranças e si mesmo.

Se as horas passavam já não importava. Depois de anos imaginando que
música tocava o universo, achou irônico dançar a som nenhum.
E como se o destino ainda houvesse salvo uma última peça a lhe pregar,
via sua nave agora sucumbindo a tremores fortes, como se acometido a um terremoto e
por sonho ou pesadelo estava em terra.
Sua mente trabalhou rápido a descobrir do que se tratava. Havia sido sugado em um buraco negro
e com ele toda esperança restante.
Havia chegado aonde nenhum homem tinha chegado e nenhum homem jamais saberia disso.
Havia se tornado um passo além.
Sinonimo de solidão.
O homem das estrelas.

Deixa pra lá

Uma casa a venda no fim da rua
vazia
escura e só
E eu encontrei abrigo na casa
sem graça
com a tinta lascada cor de azul

No quarto frio um espelho
me olho sem jeito
sem saber quem sou
Fiz amizade com a casa por dó
por entender
nem todo vazio esta só

O telhado esburacado um retrato de mim
sofrendo com a chuva
com a culpa de ser assim
Aos poucos a casa me abraça, me acolhe
e por mais que me molhe
hoje somos um

feche a porta, não vê o frio chegar?
feche a porta
que é hora
de deixar pra lá

Os Dois

os dois se encontraram a distancia
uma distancia finita separava os dois
quem dera se os dois pudessem sair de fininho
sem ter que ver o quebrar de ambos corações
de um lado aflita e otimista
de um outro, amargo e cantador
de um lado encantada com a vida
de um outro, espantado com a dor
solitário, não sabia não ser sozinho
boazinha, não sabia ser má
achava melhor trilhar só o seu caminho
não sabia, mas sofria por saber amar
os dois se olharam as avessas
a vida olhou os dois
então achou melhor mantê-los separados
pra quem sabe se acharem depois

ele queria muito o bem dela
ela queria muito o bem dos dois

Ocaso

Por entre os vãos
atrás de paredes ocas
guardado por correntes de ferro podre
por cães doentes
os meus medos
pequenos segredos
se transformam em monstros ferozes
venenosos ao toque.

Num baú sem tranca
um cofre sem combinação
escondido a plena vista
nesse quintal de mato alto
insetos rastejam
se alimentam do que sou
se apoderam do meu ser
o que vê é o pouco que restou

De barba falha e grisalha
cabelo sem corte e por pentear
olhos semi abertos, fracos
procurando desesperadamente por algo mais
mãos frias feita o peito
coração que bate de teimoso
olhando da janela a vida
que há tanto o abandonou.

E o que fez foi pensar demais.

Tu eu e tu

Você não entende
que meu grande plano é não ter plano algum.
Ficar quietinho, parado do seu lado
e torcer pra você não se cansar.
O que eu tenho em mente?
Penso rápido numa resposta bem comum.
Finjo um jeito acanhado
e se finjo algo é pra não te assustar

Eu
eu sei ser bem normal
pão com manteiga de manhã
a noite telejornal,
fingir que nem te quero tanto assim.
Seu
seu jeito de dizer
que está tudo bem agora.
E o que mudou na última hora?
além de que te quero muito mais que quis.

Meu plano B
é saber pr'onde fugir e ir bem longe de você.
Correndo feito em sonho, cada passo um tropicão.
E me ver, enfim, batendo palma em seu portão.
Quando me olha
me devora aos poucos, me cura e me mata sem saber.
Mal sabe que te quero, e quero o que?
Melhor não te assustar.

Sei lá

Empurro o lençol com o pé
levanto descalço despreocupado
não trabalho mais
melhor fazer, sei lá, um café.
Escuto de longe o celular tocar
nem vou correr
pra que me preocupar
não é você, eu sei, sei lá.

Começa a chuva
olho a roupa de 3 dias no varal
e mal não faz
não é desculpa
com tanto, pra que chorar com algo tão banal?
não importa mais

Ligo a TV
sinto falta de alguém a mentir assim
finjo que é pra mim
deve ser, sei lá.
Acordo com um trovão
me marcando o peito, que dor
passo os dias a supor
que sei de tudo mas sei lá

Começa a chuva
olho a roupa de 3 dias no varal
e mal não faz
não é desculpa
com tanto, pra que chorar com algo tão banal?
não importa mais.

Casualidades

Transavam ocasionalmente.
Ele comia ela.
Ela comia ele.
A certa altura ninguém estava certo de mais nada, se chamavam aquilo de sexo. Se era certo ou errado,
se certos orifícios deveriam ou não ser violados. Mas o final era sempre surpreendente, era como zerar o mesmo jogo varias vezes e nunca repetir o final. O sofá manchado era usado as vezes quando um dos dois
aprendiam algo novo por ai. E cada mancha era especial porque ele amava
como a perna dela tremia antes de gozar.
Ela amava como ele se perdia olhando em seus seios.
E começava sempre assim, um vinho, uma cerveja. Ela o beijava, as mãos se perdiam.
Urros desafinados, estranhos na noite. O destino parecia os unir, pois sempre que sentiam falta de
toda aquela bagunça eles simplesmente se esbarravam, as vezes em uma fila de supermercado, as vezes, pra
surpresa dele, na seção pornô de uma locadora qualquer.
Não havia uma hora errada, e todo momento parecia o ultimo. Então os dois se entregavam em oferecer prazer
um ao outro. Eram duas pessoas perdidas encontrando debaixo dos lençóis o que parecem ter procurado a vida
toda.
Mas ultimamente as coisas estavam estranhas.
Ele comia ela.
Ela estava ali.
Ele havia notado a falta de interesse, mas achou apenas que ela tinha tido um dia difícil e que talvez
ela não queria falar sobre isso. Que ela, talvez quisesse apenas que de alguma forma ele a fizesse esquecer.
Ela lhe dava credito pelo esforço, mas nada que ele fizesse faria sua perna tremer. Não dessa vez.
Eram muitos "talvez" e ele não conseguia se concentrar. A mente vagava. Até que se viu ali, nu,
com o pênis meia bomba na vagina dela. Ela de quatro nem notava o dedo dele em seu ânus.
A musica tocava lá fora, ele apenas olhou pra baixo e pela primeira vez ele sentiu vergonha dela.
Pegou rápido uma toalha jogada no chão e se cobriu, ela assustada olhava ao redor, como se tivesse acordado
de um transe e não reconhecera o lugar, entrou debaixo do lençol e olhou pra ele. Pela primeira vez ela
viu ele, sentado no chão do lado da cama, um cara comum. Não era mais aquele cara magnifico do qual
ela costumava se vangloriar na frente de suas amigas. Ele, era apenas um cara comum.
Continuava a olhar pra ele tentando entender a situação. E entendeu, ela costumava se orgulhar da vida que levava.
Era respeitada no trabalho, pelos amigos e família. Era independente, gostava de ser assim.
Por isso estava confusa. O que havia mudado? Porque agora ela se sentia velha? Usada? Se sentia doente?
Como chegara ali? Aquela situação?

A mente começou a trabalhar rápido, tentando entender.
Tudo bem - falou consigo mesma - você o conheceu na festa da Ana, fim do ano passado. Não, não, foi
no barzinho novo que o abriu perto de casa. Não também não. E ela começava a ficar preocupada, não lembrava
dele. Transavam a tanto tempo e ela não lembrava aonde o conhecera e porque ela estava pensando nisso
tudo agora. Onde ela estava com a cabeça? Ele poderia ser perigoso, não, isso não. Afinal se ele fosse
mesmo perigoso ele já teria feito algo.
Definitivamente tinha algo a ver com a Ana. Talvez se ligasse pra sua amiga ela saberia lhe dizer.
Mas aquela hora ela estaria dormindo. E não seria bom encher a cabeça dela com isso agora, porque ela andava
tão estressada. Um idiota andava espalhando por ai que havia transado com ela. Feito loucuras com ela,
e essa conversa tinha chegado nos ouvidos dos pais que não gostaram nenhum pouco. Era melhor não
incomodar a amiga agora - pensou.
Chegou a conclusão que estava fazendo tempestade em copo da agua, tudo que ela precisava fazer era perguntar
a ele aonde tinham se conhecido, só que de um jeito que ele não notasse que ela não sabia.
Talvez rir um pouco e perguntar com um ar nostálgico se ele lembrava de quando se conheceram.
Isso, era isso. No momento que tomava coragem pra quebrar o silencio a voz dele grave, disparou uma frase
que acertou seus ouvidos e agora a deixava enjoada e incapaz de responder o que quer que ele perguntasse depois.
E tudo isso porque, ele enrolado na toalha sentado do lado da cama disse:
- Ana, eu acho melhor eu ir embora.

Tudo que ela conseguiu pensar foi:
Porra, eu sou a Cláudia!